21 novembro, 2011

Crise ou transição?

Há muito que a crise na Arquitectura, enquanto profissão, está instalada. Este é de facto um dos temas mais falados por entre arquitectos e aspirantes a arquitectos. Em Portugal, há pelo menos uma década que jovens arquitectos e até mesmo ateliês de alguma dimensão se tentam reinventar na tentativa de se destacarem tentando por um lado, de se libertar de linguagens e modelos "caducos", e por outro de se aproximarem mais perto da sociedade.

Nos últimos 20 anos, os avanços tecnológicos e a revolução na mundo da internet veio não só permitir um grande avanço e rapidez na formulação dos mais diversos conceitos de projecto mas também auxiliar em grande medida nas suas mais diversas formas de representação tais como modelos 3D, animação, pormenorização, etc. A internet abriu a grande porta à discussão nesta área e é efectivamente responsável por estabelecer pontes entre profissionais, estudantes e/ou até mesmo curiosos. Há muito que em Portugal a Arquitectura estava afastada da Cultura e o seu contacto era feito através de revistas e publicações da especialidade tendo como principal alvo o arquitecto.

Felizmente tenho observado que esse tempo, essa era, culminou. A Arquitectura passou então a fazer parte da programação dos canais de televisão e tem se registado um aumento de colunas sobre o tema em revistas e jornais. Claro está que esta mudança cultural e intelectual ainda nada ou pouco se reflecte no volume de trabalho que muitos tanto anseiam. O lado positivo é que finalmente a Arquitectura está mais presente e em diálogo com a sociedade e isso irá sem dúvida reverter o estado actual da profissão.
Muitos problemas têm sido identificados e explorados por entre jornais, blogues, revistas, etc, e por isso não quero desenvolver este tópico. No entanto a manifestação do problema do Arquitecto e da Arquitectura É o tema da actualidade, não fosse este um momento de transição económica, social mas fortemente cultural. Muitos chamam-lhe de crise... eu cá prefiro palavras como as de reflexão ou transição.
Abaixo deixo o link para mais uma crónica sobre este último tema escrita pelo colega Tiago Mota e extraída do P3 do jornal "O Público".

Doce Controversa Arquitectura!

Texto: Rodrigo Ferreira Rodrigues
Imagens: Lara Jacinto, in "O Público"

02 novembro, 2011

Useless? A Dor errante

De Hans Maier-Aichen e Max Bruinsma

Quando Phillippe Starck afirmou que “o design é absolutamente inútil”, tocou num nervo sensível. Afinal, a história do design está carregada da ideia modernista de utilidade. Desde inícios do século XX, o funcionalismo tem feito parte do ADN do design, enfatizando as características intrínsecas de um produto e em que medida este satisfaz as necessidades do utilizador.
Mas no actual mercado de massas, o enfoque transitou: a produção é direccionada em função da geração de receitas, e maximizar vendas com o mínimo de custos parece ter-se tornado principal objectivo do design. A funcionalidade básica de um produto é agora a sua capacidade de ir a reboque da mais recente e lucrativa tendência de mercado. E para esse efeito, cópias baratas são melhores que originais dispendiosos.
Em parte alguma se consegue experienciar mais intensamente este afunilamento – ou simplificação redutora – do que se considera funcional que nas feiras para profissionais: uma sucessão infindável das ditas últimas tendências. Para o observador que vagueia por estes vastos bazares de imitações e cópias a viagem é dolorosa. Mais que pés doridos, o que prevalece é a dor na alma. A esmagadora maioria daquilo que se celebra como “novo” é perfeitamente intercambiável com as novidades do ano anterior. A esmagadora maioria é redundante.
Um dos conceitos fulcrais do funcionalismo – suprimir a redundância, quer do desenho do próprio objecto quer do seu processo de produção – foi subvertido para o seu oposto: celebrar a redundância como a forma mais eficaz, do ponto de vista da rentabilidade, de simular inovação. Assim, numa interpretação simplista do funcionalismo, o que se considera sem utilidade do ponto de vista comercial é eliminado do projecto. A variação em aberto – este mecanismo essencial da evolução – é minimizada. A dialéctica de tentativa e erro cessa.
Nos anos 80 do século passado, houve um momento em que se pensou que a relação do design com a ideologia modernista do útil havia sido descontinuada, tomando uma direcção radicalmente diferente. O que foi o pós-modernismo senão uma tentativa espirituosa de quebrar com o regime da utilidade, enaltecer o capricho e louvar a forma?
Do ponto de vista funcionalista, o pós-modernismo pode ter celebrado o “ruído”, mas veio igualmente complementar os genes mais mundanos de resolução de problemas do design, focando as suas raízes culturais.
Permitiu restabelecer a ligação do design à função simbólica que desde tempos imemoriais tem sido o território das artes “aplicadas” ou decorativas. Esta fonte interminável de ornamentações aparentemente inúteis e de objectos sem aparente finalidade prática serviam não apenas como sinal de preciosismo e status, mas sobretudo como uma expressão de valor cultural – de civilização, por assim dizer.
As artes decorativas são o domínio de antigos processos e técnicas artesanais altamente desenvolvidas que hoje estão quase exclusivamente associadas a raros e caros objectos de coleccionador – bem como à tradição. Mas cada vez mais, esta é também a arena da experimentação com novas formas, materiais e processos de produção, bem como para o confronto crítico entre forma e função – precisamente o tipo de exploração em aberto que foi eliminada pela indústria mainstream como sendo pouco rentável.Muitos dos objectos de luxo e extrema sofisticação daí resultantes são hoje chamados de “design de arte”. Rejeitam noções banais de utilidade e podem mesmo parecer estar a anos luz da responsabilidade do design em resolver os problemas do “mundo real”, nas célebres palavras proferidas pelo decano do design sustentável, Victor Papanek, há trinta anos atrás.
Mas apontam igualmente para um redireccionar das quantidades colossais de recursos energéticos, materiais e humanos, canalizados para o desenho de bens de consumo produzidos em massa Apontam para um novo – ou renovado – paradigma de desenho, produção e consumo conscientes de produtos mais preocupados em fazer sentido de forma sustentável que em ter lucro a qualquer preço.
O objectivo de Useless? A Dor Errante é encontrar as repercussões do “ruído” na temática do uso. Levantar questões a partir do confronto entre o que parece “sem uso” e o que aparenta ser funcional; entre consumo ostensivo e os fundamentos culturais do uso.
Transferindo o nosso enfoque da eficácia de mercado para a dialéctica de exploração, a exposição explora o proveito do “sem uso”.